Trabalhador cuida de uma fornalha elétrica de fundição de fosfato usada para fazer fósforo elementar em 1942, em Muscle Shoals, Alabama.
OBS: O texto abaixo é uma tradução autorizada do original ‘Peak Phosphorus?’ da revista Distillations Magazine.
O fósforo ajuda na energia das células e forma a espinha dorsal do DNA. É também um ingrediente vital nos fertilizantes, que pode ficar escasso num futuro não muito distante.
Por Sam Kean
O nitrogênio é um daqueles elementos aparentemente comuns com uma história surpreendentemente viva. Os cientistas do século XIX reconheceram-no como um nutriente essencial para as plantas e, portanto, um componente-chave do fertilizante. Infelizmente, porém, a forma mais comum do nitrogênio ao nosso redor – o N2 no ar – não é palatável para as plantas. Elas simplesmente não podem usá-lo. Assim como você ou eu morreríamos de sede se encalharmos no meio do oceano, também a maioria das plantas morreria de fome se suas raízes ficassem suspensas no ar. Ainda mais frustrante para os químicos do século 19 foi sua incapacidade de sintetizar as formas de nitrogênio que as plantas usam, e essa falha tornou os depósitos naturais de substâncias ricas em nitrogênio, como o guano das aves, bastante valiosos. Na década de 1860, a Espanha e suas antigas colônias chegaram a guerrear pelas ilhas ricas em guano do Peru.
Toda essa disputa pelo nitrogênio acabou exatamente um século atrás. Em 1909, o químico alemão Fritz Haber descobriu um método para converter N2 em amônia (NH3), uma forma muito mais útil. Então, em 1913, outro químico alemão, Carl Bosch, descobriu como ampliar a reação de Haber, possibilitando a produção industrial de fertilizantes. Em conjunto, essas foram duas das mais importantes descobertas da história: sem o processo Haber-Bosch, uma em cada duas pessoas na Terra não existiria.
Ainda assim, as plantas precisam de mais nutrientes do que somente o nitrogênio. Elas precisam de potássio e enxofre e até mesmo de elementos obscuros como o molibdênio. Talvez mais importante, elas precisam de fósforo para ajudar a formar a espinha dorsal do DNA e alimentar suas células. Infelizmente, as fontes de fósforo do mundo podem em breve ficar baixas – o que leva à necessidade de um novo processo Haber-Bosch, para o elemento 15, para o próximo século.
A maior parte do fósforo que vai em fertilizantes é extraída de rochas ricas em fosfato. A mineração de fosfato começou a sério depois de 1938, quando o presidente dos Estados Unidos, Franklin Roosevelt – apesar da Grande Depressão e da iminente guerra mundial – dedicou tempo para fazer um discurso sobre a química. Especificamente, ele alertou os agricultores sobre o rápido esgotamento do fósforo no solo dos EUA, principalmente devido a décadas de agricultura intensiva. A história está se repetindo agora, porque depois de 75 anos de mineração intensiva, as fontes de fósforo mais puras e disponíveis estão em baixa.
Quão cedo poderíamos enfrentar uma escassez? É uma pergunta complicada. Alguns cientistas argumentam que isso poderia acontecer em menos de 30 ou 40 anos; outros dizem centenas. Alguns desses números são baseados em estimativas, fornecidas por empresas de mineração, de quanto minério extraível existe em seus territórios. Para ser bem honesto, as empresas de mineração têm interesse em exagerar esses números, a fim de estimular o investimento. Os analistas também discordam sobre se certas fontes conhecidas de minério – como as do Marrocos, que têm depósitos imensos, mas inexplorados – sempre serão viáveis para minerar.
Independentemente disso, há uma preocupação crescente de que grande parte do fósforo mais disponível já tenha sido retirado do solo. Em alguns círculos, os cientistas falam sobre o “pico do fósforo”, a ideia de que a produção de fósforo poderia estabilizar dentro de algumas décadas, quando o mundo poderá enfrentar preços exorbitantes e escassez generalizada. Essa frase ecoa preocupações semelhantes às do pico do petróleo, mas o pico de fósforo pode ser pior em alguns aspectos. Podemos pelo menos imaginar alternativas ao petróleo, como energia solar ou hidrogênio. Não há substituto para o fósforo.
Então, quais estratégias podem ser adotadas por Habers e Bosches? Por um lado, eles poderiam descobrir um melhor meio de entrega bioquímica para que as plantas absorvam o fósforo mais prontamente. (Atualmente, as plantas absorvem apenas um quinto do fósforo aplicado a elas; o resto é levado embora.) Ou os cientistas poderiam descobrir maneiras melhores de extrair o fósforo do solo. As plataformas continentais, embora submersas e difíceis de minerar, contêm abundância de fósforo e muitas formações rochosas contêm o elemento em baixas concentrações. Mas ninguém sabe como concentrar todas essas moléculas perdidas sem causar grandes danos ao meio ambiente. É aí que o gênio é necessário.
Outra estratégia envolve a reciclagem da urina. (O alquimista alemão Hennig Brand descobriu o fósforo em 1669 recolhendo galões de sua urina e fervendo-a.) Empresários já inventaram banheiros “sem mistura” que desviam o número um e o número dois para tubos diferentes e capturam a urina para processamento. Esses banheiros especiais são promissores porque são uma tecnologia passiva: as pessoas os instalam uma vez e os canos fazem o resto.
Dado o pobre registro histórico de profecias sobre a escassez de recursos e calamidades alimentares, as probabilidades são de que o pico de fósforo não destruirá a civilização. Mas só porque não enfrentaremos a fome malthusiana não significa que não teremos problemas significativos. Diziam as pessoas no século passado que Haber e Bosch que eles alquimizaram o próprio ar em alimento. Garantir um fornecimento estável de fósforo pode exigir uma magia química similar.
O texto é uma tradução autorizada do original ‘Peak Phosphorus?’.
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